quarta-feira, 9 de outubro de 2013

A menina de Wu

O vinho corre
        em taças de ouro.
Chega a menina de Wu,
        quinze anos montando um cavalo fogoso.
Tem sobrancelhas pintadas de negro,
        as botas de cetim vermelho.
Ainda tropeça nas palavras,
         mas canta como um rouxinol.
No calor da festa
         aconchega-se em meus braços.
Que faremos ambos
        por detrás das cortinas da cor do hibisco?


Li  Bai

Poemas de Li Bai
Tradução de António Graça de Abreu
Instituto Cultural de Macau, 1996

segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Fujo da memória


Oiço os teus conselhos
se piso o chão descalço
(era adolescente)

Oiço pedir água
troco

E o teu ventre
pulido
de novo me arrepia


António Reis

Poemas Quotidianos, ed. Portugália, 1966

sábado, 5 de outubro de 2013

A caça

a caça. abriu a caça
os cães pela madrugada dentro sôfregos,
cheios de doçura e morte.

sexta-feira, 6 de setembro de 2013

A pequena morte

Tão perturbado amor
este, o que escorre
como a goma das árvores,
este que feito cão
uiva e cintila.

O amor com suas facas, suas cordas,
o seu lenço cigana -
- abrindo as frestas,
dividindo a pele.

Eis a mulher. Deitada sobre os sons
na volúpia da espera:
a pão e água.
Desejando o amor, o risco exangue,
a exposição das coxas,
o temível sabor do homem.

Esperando:
como um ser punido e olhado,
entre cetins desfeitos,
a ferida.

A vagarosa morte,
esse prazer.

Hélia Correia
in A pequena morte

terça-feira, 3 de setembro de 2013

Invocação

Oh! desgraçada Hispania
de belo nome, rosa
de minúsculas pátrias!

Como podemos ainda
tolerar que os bárbaros
sujem o teu nome?

Francesc Vallverdú
in Poetas Catalães de Hoje

domingo, 28 de julho de 2013

[Não posso adiar o amor para outro século]

Não posso adiar o amor para outro século
não posso
ainda que o grito sufoque na garganta
ainda que o ódio estale e crepite e arda
sob montanhas cinzentas
e montanhas cinzentas

Não posso adiar este abraço
que é uma arma de dois gumes
amor e ódio

Não posso adiar
ainda que a noite pese séculos sobre as costas
e a aurora indecisa demore
não posso adiar para outro século a  minha vida
nem o meu amor
nem o meu grito de libertação

Não posso adiar o coração

António Ramos Rosa

A Palavra e o Lugar, Publicações Dom Quixote, 1977

ODE Á BELEZA DA PALABRA


SÓ a palabra vale. Unicamente
ela ilumina o mundo,
dalle claridade ás cousas
e fai nídia e intelixíbel
a confusa escuridade do noso
ser, mortal e indeciso.
Tudo muda. Somente a palabra
permanece, na súa infinitude,
se leva dentro de si a chama
que um día queimou, con
lúcida paixón e con verdade,
a desolada flor da nosa vida.

Manuel María

in As lúcidas lúas de Outono