sábado, 26 de janeiro de 2008

Casa


Imagem brusca: o homem assoma à porta da casa inabitada. Volta-se para o interior (só lhe vejo a mão). O homem fala com o devoluto: como se para lá da porta houvesse uma plateia de fantasmas, ou personagens que perderam a voz, o rosto, luz, a ternura. O homem irrompe da casa. Agora o homem perante a luz. É um africano, excluído de rua, por certo, e de súbito se vê dono da casa. A mão presa na porta sustém o corpo, impreciso na posição, como se o homem fosse menino a aprender os gestos primordiais. Estará bêbado, dirige a fala a transeuntes acossados (serão eles também espectros?). Ninguém o ouve, ninguém repara na humilde personagem. Fecha a porta, silencia devagar o devoluto. Banzo. Despede-se da propriedade, banzo. Na porfia da noite, o derradeiro caminho da morte.

(Foto de Augusto Baptista)

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