segunda-feira, 19 de maio de 2008

Laranjas verdes

No silêncio do olhar dos gatos há camadas de memórias, sedimentam-se, em aluvião. Matéria de aluvião. Mas que guardam, que defendem ou preservam, todos estes gatos em redor do castelo de Castro Marim? E o olhar dos novos felinos, descobre o homem, herda o mesmo silêncio: adensa a espessura de vida para vida. Matéria de aluvião, a memória. Que desvario cometeram os gatos, quem os condena a arquivar o silêncio?

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O homem desce do castelo, não traz lança em riste, nem uma pedra em cada mão. Inerme, liberto do homem anacrónico. Desiludido, contudo, desiludido por não decifrar o silêncio acocorado nos olhos do gato. Perto da noite, detém-se num pequeno terreiro com laranjeiras, um lago ao centro, brancura limpa das casas em redor. Na soleira da porta, uma mulher e uma menina em silêncio. É Agosto, pensa o homem, incomodado com a quietude infantil. Aproxima-se do lago, com seu chafariz emudecido, e descobre quatro laranjas verdes no fundo da água.

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