sábado, 30 de maio de 2009

S. Bento das Guavieiras

não encontrei os que vêm de maio e seu ledo
cortejo. digo, a palavra leva-me por trilhos
antigos, entre tojo molar e carqueja.
povo de s.bento das guavieiras
de que resta só o nome nas memórias
paroquiais de 1758 e o fojo, na garganta
da serra, para a pesca de lovos
e javalizes
. lugar de martírio, rude memória
tangível.

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Que morre devagar

E de quem são as casas, pergunta o homem do saco de cabedal. Olhe, medraram da ruína tão lestas como tortulhos em grainha de uva. Foram nossas, do povo da aldeia que morreu devagar, porque ninguém tem pressa de ver Deus. Quem as explora? Disso não estou a par... Mas uma coisa é certa, desagrada-nos a pouca vergonha que arribou a esta terra. Até mulheres nuas, nuas como vieram ao mundo, nascem nas bordas do rio. Não é que a gente desgoste da caça. Sabe, a velhice: sentimos coelho na toca e falta-nos o furão, entende. De quem são as casas? Ó amigo, será que eu falo galego!

quarta-feira, 27 de maio de 2009

O amante

Era devoto do vinho. Com a Primavera desaguava no café próximo do escola secundária. Lentamente, espiava as pernas das raparigas. Algumas incendiavam a cena: erguiam as saias, abriam as pernas, desabotoavam a blusa. Ele lambia-se de desejo. Ou seria tão só, afinal, o desejo do desejo. Abandonava o posto de vigia; na rua, a canalha acirrava-o com apupos. Um dia, surgiu leve, cabelo de risca à banda, casaco branco e um cigarro – extra-longo – entre os dedos da mão direita. Na outra, uma rosa de Alexandria. Deixou fugir um olhar de desdém, encenado, ao encontro das raparigas. Uma garrafa de água, por favor. Os professores de religião e moral, nesse mesmo dia, marcaram uma reunião de emergência.

terça-feira, 19 de maio de 2009

Veloz primavera

agora a andorinha
rente ao chão

veloz primavera
nos olhos do gato

quinta-feira, 14 de maio de 2009

Cerejas

partilho as cerejas com a fome autóctone
das aves. maio, espantoso maio: tudo visita
a cerejeira, no fundo do quintal.rubra doçura.

quarta-feira, 6 de maio de 2009

Rio de montanha

a truta na sombra do salgueiro
caída na água
um gesto, o estalido de ramo seco
e tudo se perde. maio, o coração
precário de maio